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domingo, 28 de setembro de 2008

O PEQUENO ARCO ÍRIS...





Lembro-me como se fosse hoje...
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Eu não queria ir à escola, porque eu não tinha feito amigos. As outras crianças zombavam de mim por causa das minhas roupas velhas e maltrapilhas, e também por causa da minha timidez. O que eles não sabiam, é que minha timidez era pelo medo de que zombassem sempre de mim e também, porque estava muito triste porque meu professor, não ligava para mim. Parecia que ele tinha decidido, que se eu era uma criança pobre, não merecia receber sua atenção. O comportamento dele para comigo, me machucava muito. Eu não compreendia o porque de tudo aquilo estar acontecendo comigo. Todos os dias, eu tinha que andar um longo caminho, ida e volta para a escola. Em certo trecho, a estrada tinha bosques de eucalipto nos dois lados e também um riacho lindo, que passava por entre as arvores, com águas muito cristalinas. Ele corria mansamente, fazendo do ambiente, um lugar de muita paz.
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De vez em quando, eu parava por lá para descansar e observar os peixinhos. Eles nadavam de lá para cá. Pareciam estar sempre tão alegres e felizes. Viviam em turmas, sempre acompanhados por seus amiguinhos, subindo e descendo nas águas límpidas do riacho. Certa manhã, em meu caminho para escola, eu parei às margens do riacho e sentei-me numa pedra. Tirei meu chinelo e coloquei meus pés na água fresca que parecia me acariciar. Algum tempo depois, com os cotovelos apoiados em meus joelhos, pensando em quanto a escola era chata, sem amigos, sem a atenção de meu professor, senti uma lágrima rolar pelo meu rosto. Vi quando ela caiu nas águas do riacho, desaparecendo ao misturar-se com elas. Foi como se ela tivesse sido abraçada por elas, num gesto de carinho, pois ela era uma lágrima sentida, uma lágrima de dor.
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Em dado momento, numa fração de segundos, um arco íris surgiu das águas, passou bem diante dos meus olhos, e desapareceu. Era um peixinho, um Lambari, percebi logo depois. Ele ficou muito próximo da superfície, quase parado. Era como se estivesse me observando curiosamente, mas num piscar de olhos, ele desapareceu em meio à correnteza.
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Segui para a escola e o dia custou a passar. Era uma agonia estar num lugar, onde as pessoas não me aceitavam como eu era, e eu nem mesmo tinha a atenção que tanto desejava de meu professor.
Na volta para casa, parei no mesmo lugar onde eu vi o pequeno arco íris e esperei algum tempo. Mais uma vez, ele surgiu de repente como um flash de luz em minha frente e então, desapareceu.
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Na manhã seguinte, estava um lindo dia de sol. Eu resolvi tirar minha roupa e entrar nas águas e quando o fiz, ele apareceu e como se me provocasse ele começou a nadar à minha volta. As suas escamas brilhantes, iluminadas pelo sol, cintilavam mesmo sob as águas e seus movimentos de lá para cá em volta de mim, me fez sorrir. Me fez esquecer dos meus infortúnios, de toda a minha tristeza. O pequeno arco íris pulava para fora da água alegremente, mas sempre se mantendo perto de mim. Ele parecia não ter medo. Lembro-me que estava tão feliz com aquele amigo, que surgiu do nada, que um pensamento me veio à mente.
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Eu queria que ele ficasse comigo para sempre!
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Num rápido movimento, eu o agarrei com as duas mãos. Eu queria leva-lo comigo. Não queria mais sentir a dor da solidão. Ele se debateu desesperadamente tentando se libertar de minhas mãos, e num instante, ele escapou pulando para longe, caindo no meio do mato em uma das margens. Ele era tão pequenino. Era tão difícil de se procurar no meio das folhas, que eu demorei um tempo para encontra-lo, e quando o achei, ele não se movia. Parecia estar morto. Naquele momento, uma sensação desoladora de perda invadiu meu coração. Eu tinha perdido meu primeiro e único amigo, e tudo por causa de meu sentimento de posse, querendo que ele fosse só meu. Que ficasse para sempre ao meu lado. Devagar eu peguei seu corpinho inerte e o coloquei nas águas do riacho. Ao ver a correnteza leva-lo para longe, lágrimas de dor e tristeza, rolaram como gotas de ácido, queimando minha face. A dor da perda do meu amigo, meu pequeno arco-íris, era muito mais forte do que os meus sentimentos de tristeza e solidão, causados pela zombaria das outras crianças e, pela indiferença do meu professor.
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No dia seguinte, passei pelo mesmo local na esperança de vê-lo novamente, mas ele não apareceu. Eu me senti mais solitário do que nunca em toda a minha vida. Mais um dia se passou. Na volta da escola, parei de novo no mesmo lugar. Esperei alguns instantes, mas ele não apareceu. Segui rumo á minha casa, com uma dor insuportável em meu peito, era um sentimento de remorso, misturado com um imenso arrependimento, pelo que eu tinha feito com o pequeno arco íris. No dia seguinte, eu ia passando novamente pelo mesmo local, mas já não tinha mais esperanças de vê-lo novamente. Tinha certeza de que ele havia morrido.
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Resolvi parar por uns instantes e tomar um pouco de água. Eu estava mesmo com muita sede, e as águas do riacho eram tão limpas, que não tive dúvidas; me abaixei para pegar água com as mãos e quando o fiz, como num flash de luz, um arco íris passou bem diante dos meus olhos, e desapareceu.
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Naquele instante, meu coração pulou de alegria. Minha alma cantou, eu estava feliz. Meu amigo não havia morrido, e mais, ele não ficou com raiva de mim pelo que fiz, e para provar que não, quis chamar minha atenção para que eu o notasse, já que eu havia me desiludido de encontra-lo e nem mesmo o estava procurando com o olhar. Levantei-me de onde estava, sabia que já era tarde e segui meu caminho.
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No dia seguinte, ia ser sábado e a data de meu aniversário. Logo pela manhã, eu resolvi que iria tomar um banho no riacho e procurar meu amigo. Eu estava com saudades. Precisava estar em sua companhia. Era vital para mim. Quando lá cheguei, o sol já brilhava iluminando as águas que corriam fazendo um barulho suave, um som mágico que me causava uma paz imensa, que me fazia muito bem. Sentei numa pedra e esperei. Não por muito tempo, pois logo ele apareceu. Brilhando sob as águas e indo de lá para cá, lá estava ele, mas sempre dando uma parada diante de mim. Era como se de alguma forma, ele me convidasse a fazer parte da brincadeira. Tirei a roupa, entrei na água e a princípio, ele ficou longe de mim. Ele ia de lá para cá, mas mantendo distancia entre nós, mas depois, ele foi se chegando. Cada vez mais e mais. Até que as suas escamas tocaram suavemente minhas pernas, e então, eu comecei a sorrir.
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O pequeno arco íris, ao ouvir meu sorriso, começou a pular alegremente para fora d`água. Era como se ele estivesse feliz com minha presença e comemorando minha felicidade.
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Naquele mágico momento, eu aprendi de uma vez por todas, que ele nunca, mas sempre, seria meu.  Que quando amamos alguém, não significa que este alguém é de nossa propriedade. Um objeto que podemos guardar conosco e usar quando queremos. Quando nos for conveniente. O amor precisa ser livre, para viver em nossos corações e nos corações daqueles que nos amam. Se um de nós tentar prendê-lo, achando que ele é de nossa propriedade, ele pode definhar lentamente, até morrer. Podemos mata-lo sem ter consciência disto. Exatamente como meu amigo peixinho que eu quase matei, por achar que ele era meu e que eu poderia fazer dele, e de sua vida, o que bem quisesse e o que eu bem entendesse.
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A vida nos dá lições em todos os momentos de nossas vidas. Desde o momento em que aqui chegamos, até o momento de nossa partida.
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Cabe a nós, ter a capacidade e sensibilidade, de perceber, enxergar e compreender as mensagens que nos são enviadas por ela através de momentos muito especiais, como quando, vindo do nada, um pequeno arco íris passou bem em frente aos meus olhos, e então desapareceu...
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Autor: José Araújo

domingo, 21 de setembro de 2008

A MÃE NATUREZA...




Dudu estava jogando em seu vídeo game, Resident Evil 4. Naquele momento, ele vivia as emoções do personagem principal do game e de repente, El Salvador, derruba com os pés a porta que dá acesso ao corredor onde esta Leon Scoot Kennedy o mocinho da trama. El Salvador, um dos grandes vilões do jogo, após derrubar a porta, empunha uma ameaçadora serra elétrica e parte para cima de Leon. Dudú nem pisca seus olhos. Ele tem que controlar com o Joystick o Leon, que precisa fazer de tudo para derrotar El Salvador. A tarefa de Dudu não era muito fácil, pois o ardiloso personagem do mal era muito astuto em seus ataques. Desde que chegou da escola, horas se passaram e a disputa era acirrada entre os personagens. O menino após tanto tempo em frente à televisão, vivendo o stress e as emoções da batalha travada no game, já estava com os olhos vermelhos, suas vistas ardiam, estava pálido e a fome e o sono, finalmente o derrotaram. Ele se levantou da cadeira onde estava jogando, se espreguiçou, na tentativa de minimizar as dores e o cansaço físico, causado pelo tempo e pela postura em que ele ficou enquanto estava jogando. Dudu caminhou pelo corredor até a cozinha, abriu a geladeira, pegou um copo de leite, colocou na mesa onde sua mãe havia deixado um pacote de bolachas recheadas que ele adorava, isto porque não almoçou, nem tocou na comida que sua mãe havia deixado pronta para ele. Era só esquentar no micro-ondas, mas ele não quis perder tempo, tinha que se empenhar no jogo, e preferiu o vídeo game. Enquanto ele tomava seu lanche, ele pensava em como passar por aquela parte do jogo, porque nela havia uma espécie de quebra cabeças que ele tinha que resolver.
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Ele não pensava em outra coisa senão no jogo e apesar de seu corpo dar sinais de exaustão, através das dores que estava sentindo, ele não desistia de encontrar a solução. Já eram quase oito horas da noite quando ele foi se deitar. Sua mãe, ainda não havia chegado do trabalho que ficava do outro lado da cidade. Mal se deitou e já adormeceu. Em certo momento, mesmo dormindo, ele sentiu como se alguém o estivesse beijando no rosto. Virou-se para o outro lado, ajeitou o travesseiro e continuou a dormir. Contudo, seu sono naquela noite, não foi como nos outros dias, porque nos outros dias, enquanto ele dormia terríveis pesadelos tomavam conta de sua mente. Neles, ele vivia as batalhas, vitórias e derrotas dos personagens de seu jogo favorito. Quando amanhecia, ele estava mais cansado do que quando foi dormir na noite anterior. Mas naquela noite, tudo foi diferente. Na parede de seu quarto, havia um quadro enorme, com uma moldura muito bonita que tomava quase toda a parede e ficava pendurado acima de um aparador onde ele colocava suas coleções de miniaturas. No quadro havia uma paisagem muito linda. Nela podia se ver um rio de águas cristalinas, que corria por entre um bosque, rumo a um horizonte distante indo desaguar num oceano e em suas margens, havia lindas flores crescendo na grama verde, uma visão de encher os olhos e fazer massagem no coração de qualquer um. Em um determinado momento, Dudu começou a sonhar e em seu sonho, ele havia aberto os olhos e sentada ao lado de sua cama, estava uma linda mulher. Seus cabelos loiros eram longos e caiam sobre seus ombros. Ela era uma visão maravilhosa. Em seu rosto havia um sorriso doce e em seu olhar um brilho estranho, mas que inspirava paz e confiança. Seu vestido, lindo e esvoaçante, era branco, com um suave tom de verde em degrade que descia até seus pés. Dudu ficou olhando aquela mulher sem dizer uma palavra. Ele estava extasiado com tanta beleza, com tanto encanto e de repente, ela se levantou estendeu-lhe a mão e pediu que viesse com ele, até onde o quadro estava pendurado. Lá, ela tocou o quadro com as mãos e de repente tudo que havia nele pareceu ter movimento.
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O sol brilhava entre as arvores nas margens do rio, pássaros voavam de um lado para o outro. Era possível ver suas sombras passarem enquanto eles voavam. Lindas borboletas sobrevoavam as flores, algumas pousavam, outras se juntavam com as demais em revoada. Havia borboletas de todas as cores. Ele nunca tinha visto nada igual. Tudo na paisagem ganhou movimento, ganhou vida. A linda mulher fez sinal para que ele subisse com ela no aparador e com um movimento, ela o colocou dentro do quadro que agora, era como se fosse uma janela aberta, uma passagem que dava em outro mundo bem diferente daquele que ele conhecia em seu dia a dia. Sentindo firmeza em seus pés quando pisou no chão dentro do quadro, ele correu para a beira do rio, tirou os sapatos e pisou na água fresca e sentiu uma sensação tão deliciosa e intensa que ele nunca havia imaginado que iria sentir. Era como se uma energia desconhecida e revigorante, penetrasse nele através de seus pés e aquilo, o fez se sentir bem, como nunca se sentiu antes em toda a sua vida. Ancorado às margens do rio, havia um barquinho, ele era branco, com uma lista vermelha em suas laterais e quando Dudu o viu, não pensou duas vezes. Correu em sua direção, entrou dentro dele e olhou admirado as velas içadas e balançando ao vento. Elas eram de um branco, que à luz daquele sol maravilhoso, brilhava como prata. O garoto soltou as amarras que seguravam o barquinho nas margens do rio e eles se foram, navegando lentamente rio abaixo.
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Durante a viagem, eles passaram por lugares lindos, nunca dantes imaginados por Dudu. Atrás deles, naquelas águas tão claras, tanto que era possível se ver o fundo do rio, seguia um cardume de peixes com escamas prateadas e douradas. Eles pulavam de vez em quando para fora d água, espirando em Dudu quando caiam de volta nela. Mais atrás, também seguia o barquinho seis cisnes brancos, três de cada lado da margem, como se fosse uma guarda real, para garantir a tranquilidade da viagem deles. Dudu maravilhado com aquilo tudo, sentiu-se como um príncipe sendo reverenciado por uma escolta de gala, no mais alto estilo. Seu sonho seguiu por noite adentro e durante toda a sua viagem naquele barquinho, ele viu coisas de que ele nunca tomou conhecimento. Seus pais sempre trabalharam fora e desde bem pequenino, sempre ficou aos cuidados de babás que cuidaram dele até certo ponto de sua vida, mas quando já tinha idade suficiente, começou a ir e vir sozinho da escola. Quando chegava em casa, tomava seu banho, aquecia sua comida, almoçava, fazia suas lições de casa e nunca teve tempo de brincar com outras crianças de sua idade. Assim sendo, ele desconhecia tudo que era comum às crianças de sua idade, não conhecia brincadeiras de criança, não sabia nada sobre os jogos infantis. Lá, nas margens daquele rio maravilhoso, cheio de vida, cheio de cor, muitas crianças brincavam juntas. Elas sorriam e gritavam com alegria e aquilo tudo, chamou muito a sua atenção.
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Curioso, ele ancorou o barquinho e desceu dele, caminhando em direção a elas. Ele precisava saber o porquê de tanta alegria, de tanta agitação e movimentação entre aquelas crianças. Afinal, as crianças tinham coisas melhores para serem feitas. Onde será que estavam seus vídeo games, seus computadores, seus jogos favoritos da Internet? Quando ele conseguiu se aproximar e falar com uma das crianças, perguntou a ela a causa daquela algazarra toda. Ela disse a ele, que era hora de brincarem juntos, que já tinham feito suas lições de casa e nada mais justo, do que suas mães os liberarem para sair de casa e se juntarem aos outros para brincar nos jardins à beira do rio. Ele achou tudo aquilo muito esquisito. Não podia compreender o porquê daquele comportamento, afinal, não havia coisa mais excitante para ele do que jogar vídeo game. Foi ai que uma linda garotinha que se parecia muito com uma de suas colegas de escola se aproximou e perguntou a ele, se queria brincar. Ele não sabia o que dizer. Ele conhecia todas as regras para vencer mais facilmente todos os mestres, como economizar munições, como aumentar o tempo dos personagens através de resgate de objetos escondidos estrategicamente em lugares de difícil acesso, mas brincar com aquelas crianças, era uma tarefa impossível!
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Todos à sua volta, brincavam de jogos de que ele nunca tinha ouvido falar antes. Ele não conhecia suas regras, nem sabia como proceder para participar. Ficou parado, sem ação. Era como se o chão estivesse se abrindo em baixo dos seus pés e ele fosse cair num buraco sem fundo. O que aquelas crianças iriam pensar dele? Qual a desculpa que ele iria dar, para dizer a eles que não iria querer participar? Que ele não sabia como brincar? A linda garotinha, percebendo sua relutância, sem que ele precisasse dizer nada, pegou gentilmente em sua mão e pediu para que ele fosse com ela. Os dois sentaram-se debaixo de uma árvore e ela começou a contar a ele, como eram os jogos, como se fazia para brincar em cada um deles. Foi então que Dudu veio a saber da existência pela primeira vez em sua vida, da Amarelinha, do Esconde-esconde, do Pega-pega, da Queimada, da Batata quente e muitos outros jogos e brincadeiras, que a menina detalhou a ele com precisão. Ela ensinou a ele todas as regras de todas as brincadeiras. Ele compreendeu cheio de emoção, a importância e o significado de se brincar como aquelas crianças brincavam, de ter os amigos sempre ao seu lado, participando de sua vida em todos os momentos e aquilo tudo, de uma forma que ele jamais imaginou, tocou fundo o seu coraçãozinho de menino e com profundo sentimento, uma lágrima rolou de seus olhos. A menina sentindo a emoção de Dudu naquele momento aproximou-se dele e deu lhe um beijo no rosto e com a mão, ela enxugou lhe a lágrima que escorria, com um sorriso doce em seus lábios e muito carinho em seu olhar.
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Ela se levantou estendendo a ele sua mão, o ajudou a se levantar e os dois saíram correndo em direção às outras crianças e foram brincar. Durante boa parte de seu sonho, Dudu brincou como nunca em sua vida. Ele correu tanto, gritou tanto, sorriu tanto, que estava exausto, mas em nenhum momento, ele sentiu dores em seu corpo, nem seus olhos arderem, muito pelo contrário. Era como se uma nova e poderosa energia tivesse tomado conta dele por inteiro, de sua mente, ele estava feliz e quando eles pararam um pouco para descansar, todos se sentaram juntos embaixo da mesma árvore e ficaram lá conversando, contando piadas e estórias que haviam ouvido de seus pais e seus avós. Enquanto Dudu ouvia as risadas das outras crianças, ele ouviu um som como se fosse um sino tocando uma música linda canção e perguntou aos outros se a estavam ouvindo também. Todas as crianças tentaram ouvir, mas não conseguiram. Disseram que ele tinha se enganado, que nem mesmo havia um sino nas redondezas, que ele deveria ter se enganado. O menino não disse, mas ele ouviu novamente o sino, mas agora ele parecia tocar dentro de sua mente, de seu coração e a musica o envolvia por inteiro, com seus acordes mágicos e encantadores. Ouvindo aquela musica linda, ele encostou-se no troco da arvore e num instante adormeceu. Ainda sonhando, mais uma vez ele sentiu como se alguém o estivesse beijando no rosto e sentindo isto ele acordou. Quando ele abriu os olhos, desta vez era sua mãe que estava sentada ao seu lado em sua cama.
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Havia amanhecido e ela disse a ele que devia se levantar, escovar seus dentes, tomar um banho e se arrumar para ir à escola. Disse também que quando ele voltasse, se terminasse de fazer as lições de casa ainda antes do anoitecer, poderia jogar um pouco de vídeo game, até a hora do jantar. Dudu olhou nos olhos de sua mãe e com medo de receber um não, pediu a ela para brincar no quintal e ainda se poderia chamar alguns meninos para brincar com ele também. Sua mãe atarefada como sempre, disse que não havia problemas, mas se ele preferisse e ela achava melhor, ele poderia chamar os meninos para jogar vídeo game em seu quarto com ele. O menino ficou triste com a falta de importância que sua mãe deu ao seu pedido, mas feliz por não ter recebido um não. Naquela tarde, ele e todos os meninos da rua se juntaram para brincar, Dudu chamou a todos seus vizinhos até o quintal de sua casa e ensinou a um por um, a brincar de Amarelinha, de Esconde-esconde, de Pega-pega, de Queimada, de Batata quente, além de muitas outras brincadeiras e jogos que ele aprendeu em seu sonho. As pessoas que passavam e viam a criançada em meio a risos e gritos de alegria, achavam aquilo tudo muito estranho, fora do normal. Elas achavam que aquelas crianças não deveriam estar ali, que aquilo não podia acontecer nos dias de hoje. Comentavam umas comas outras que os pais daquelas crianças precisavam de orientação psicológica, porque brincar livres e soltas na rua, todos juntos do jeito que estavam, era loucura e que melhor seria, se ficassem em casa, onde estariam seguras, jogando vídeo game o dia inteiro e alienadas, sobre tudo mais em suas vidas, mesmo com dores pelo corpo todo pela postura em que ficariam jogando vídeo game e isoladas do mundo e da vida.
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Em suas mentes de adultos, ocupados com seus afazeres e obrigações diárias, cegos pelo seu desejo, e obstinação de alcançar seus objetivos materiais e de se manterem a salvo da violência na cidade grande, para aquelas pessoas que os viam admiradas, certo mesmo seria que todas elas estivessem presas dentro de casa, a salvo dos perigos do mundo, tentando decifrar os enigmas e códigos, para acumular pontos e mudar de fase nos jogos de vídeo game. Afinal os tempos eram outros, o mundo havia mudado, as pessoas também, mas desde aquele sonho que ele teve naquela noite Dudu nunca mais foi o mesmo e sempre arranjava um jeito de trazer mais um amiguinho para sua turma. Era só ele ouvir dizer que em algum lugar de seu bairro havia um menino trancado em casa tentando desesperadamente derrotar os vilões virtuais, que ele não descansava enquanto não conseguia fazer com que ele conhecesse as brincadeiras que ele aprendeu e de que tanto gostava. O tempo passou, Dudu cresceu, tornou-se um homem inteligente, capaz, sensível à beleza do mundo e da vida, tornando-se diretor presidente de uma grande multinacional, através da qual ele pode fazer muito pela proteção à natureza e o meio ambiente, assim como teve a chance de fazer uma conscientização efetiva da população, sobre a importância de se dar o devido valor à natureza, em todo seu esplendor.
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Hoje, após tantos anos do que aconteceu com ele em um sonho quando era ainda um menino, Dr. Eduardo, aos 54 anos de idade, sentado em sua cadeira, na sala da presidência e que dá vista para o parque da cidade, pensa nos dois beijos que recebeu naquela noite em que teve aquele sonho, que mudou totalmente a sua vida. Ele sente em seu coração, que aqueles beijos, o de antes de ele começar a sonhar, e o de pouco antes dele acordar, foram dados a ele, por ninguém menos, do que a mãe natureza...
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Autor: José Araújo











domingo, 14 de setembro de 2008

A REVELAÇÃO...



A história de Beatriz a principio pode parecer com a de muitos educadores e educadoras, que escolheram a profissão por amor à cultura, pela determinação de querer fazer deste Brasil um país melhor, mais justo, onde o ensino pudesse ser considerado uma prioridade na vida dos cidadãos, mas na verdade, a história dela, em determinado ponto de sua vida, teve uma mudança, que para muitos de nós pode ser algo irreal, inimaginável para nossas mentes fechadas, cheias de preconceitos, de conceitos pré- estipulados, que nos cegam, que nos impedem de perceber, que além daquilo que podemos meramente ver com nossos olhos, existe muito mais do que se possa imaginar. Desde pequena, ela já sabia o que queria ser na vida, quando crescesse seria uma professora. Ela era uma aluna aplicada, comportada, prestava atenção em todas as matérias e fazia seu dever de casa com todo carinho. Sua preocupação, era de que sua professora achasse sempre seus trabalhos e lições de casa bem feitos e que lhe desse boas notas. Beatriz estudou muito. Esforçou-se o mais que pode para alcançar seu objetivo, que era o de realizar o seu sonho de ser uma excelente professora, para que pudesse dar aos seus alunos a melhor qualidade de ensino possível, pelo menos, no que dependesse dela. Um dia ela se formou e com a maior alegria começou a lecionar. Ela o fazia com sentimento, com emoção e isto fazia dela, uma professora muito especial. Contudo, o tempo foi passando e Beatriz já lecionava há muitos anos. Já havia dado aulas em várias escolas públicas e conhecia bem as necessidades dos alunos, principalmente na periferia da cidade, onde ela trabalhou a maior parte de sua vida. Mesmo morando longe das escolas para as quais ela foi designada ao longo dos anos, com todo o cansaço de praticamente fazer uma viagem todos os dias, para chegar até seus locais de trabalho, ela era incansável. Nunca demonstrava sinais de estar exausta, fazia tudo que podia para não levar até os alunos, mais problemas do que já havia em suas vidas simples e com pais na maioria das vezes, sem poder aquisitivo o suficiente, para lhes dar o básico, do básico. Mas a vida pessoal de uma professora, não é de forma alguma diferente da vida de outras pessoas. Ela tem problemas pessoais como todo mundo, tem fazes boas e difíceis na vida, é um ser humano como qualquer outro, com sentimentos, emoções, carências e necessidades. Certo dia, Beatriz começou a perceber que já não era a mesma, já não tinha mais a mesma motivação que sempre a impulsionou a ensinar seus alunos o melhor que pudesse. Emocionalmente, psicologicamente e fisicamente, ela estava sentindo-se esgotada. Era tanto, que lecionando numa classe de adolescentes, onde muitos eram rebeldes e não a respeitavam como deviam, ela passou a perder a paciência e a retribuir as grosserias e ofensas que recebia de alguns deles. Ela já tinha se casado ha muitos anos e sua vida familiar estava sendo prejudicada pelo fato de ter que dar aulas em até três escolas diferentes, para que pudesse receber um salário razoável.
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O piso salarial de sua categoria era muito baixo, mal dava para pagar as custas de manutenção de seu carro, que a levava de bairro a bairro, para cumprir seus horários nas escolas onde lecionava. Juntando os problemas que ela tinha na escola com os adolescentes, com seus problemas particulares que pareciam se agravar dia a dia, já era comum ela dar um zero como nota a um aluno que não fazia, ou entregava de acordo com o solicitado, os trabalhos que ela designava à classe. Ela nem mesmo se preocupava em saber o porquê de um aluno não ter feito total, ou parcialmente seu dever de casa. Apenas dava a nota e ponto final. Muitas vezes, no meio de uma classe de alunos rebeldes na fase da adolescência, é possível que haja alguns que estão no meio dos outros, por não ter opção e estes, com uma professora que não consegue mais enxergar as diferenças entre eles, por estar psicológica e emocionalmente abalada, são prejudicados pelos erros dos outros. Beatriz sempre foi uma pessoa sensível, sempre soube separar as coisas, mas estava num ponto que de vez em quando, ela acreditava que iria enlouquecer. Como se não bastassem os alunos, cada um com seus problemas, havia também os perigos causados pela própria sociedade e que rondam as escolas, não importa se em locais privilegiados, ou na periferia onde a violência tem maior incidência. As drogas sempre foram uma ameaça tanto aos educadores, quanto às famílias dos alunos, mas principalmente aos jovens na idade da adolescência, que nesta fase da vida podem ser influenciados facilmente, se não houver colaboração tantos dos pais, quanto dos professores ou pessoas responsáveis por eles. Lecionando sempre na periferia da cidade de São Paulo, ela conheceu inúmeros alunos que se envolveram com as drogas. Alguns saíram ilesos, ou quase, tendo sido recuperados e desviados do vício com a ajuda e o apoio de todos que os rodeavam, mas outros afundaram-se na dependência química e acabaram por chegar ao fundo do poço, de onde nunca mais saíram.
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Como professora e mãe que era, ela sempre fez de tudo para ajudar a todos aqueles que tinham se envolvido com as drogas. Fazia o que podia para conscientizar, principalmente os pais de que quando se tem um problema como este em família, a maior arma que se pode usar contra a dependência química, é a compreensão, pois o diálogo com as pessoas nestas situações não pode de forma alguma ser violento, agressivo, caso contrário, só pode piorar a situação. Mas agora, naquela altura de sua vida, nada mais lhe despertava interesse, ela não se incomodava com seus alunos. Se era guerra que queriam, era guerra que eles iriam ter. Beatriz se tornou uma pessoa fria, agressiva, não tinha mais nenhum sinal daquela que ela foi um dia. Tudo que havia em seu peito, era tristeza, decepção e uma vontade imensa de largar tudo aquilo pelo qual ela lutou a vida inteira e desaparecer sem deixar vestígios. Ela queria fugir dos problemas que a afligiam, não queria mais sentir em seu peito o medo, a insegurança, a decepção e revolta por achar que tinha falhado, tanto como ser humano, quanto como profissional. Certo dia, em meio a uma crise existencial, ela resolveu pedir uma semana de licença para descansar e tentar se recuperar. Fez as malas, deixou os filhos com sua irmã, pegou um ônibus na rodoviária do Tiete e foi para um hotel fazenda para relaxar e se recuperar, tanto mentalmente, quanto emocionalmente. Chegando ao hotel, ela foi para seu quarto, tomou um banho relaxante, vestiu roupas mais confortáveis e foi caminhar pelo jardim. Lá haviam muitas plantas e flores, o lugar era um vale verdejante, em meio às montanhas e a paisagem era linda, tanto no amanhecer, quanto no entardecer, era possível apreciar o espetáculo de que o Sol é capaz de nos proporcionar. Dia a dia, ela foi relaxando, parecia que o ar puro, o silencio, apenas ouvindo o canto dos pássaros e os outros sons da natureza, estava operando milagres em seu coração e em sua mente. No quarto dia, ela estava sentada no saguão do hotel lendo um livro sobre Feng Shui, quando sua atenção foi desviada a um velho senhor que estava sentado bem à sua frente.
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Ela passou a fixar nele o seu olhar e quanto mais ela olhava para ele, mais ele parecia diferente e então, ela começou a perceber que de alguma forma, ele tinha um brilho inexplicável e concentrando sua atenção mais ainda nele, de repente, ela não podia mais ver o homem, tudo que ela via em seu lugar, era um campo de energia que parecia vibrar. Ele tinha se tornado transparente. Agora ela podia ver além de seu corpo material, ela via a parede que estava exatamente atrás dele. Beatriz ficou sem palavras. Não sabia o que pensar, e então, ela pode perceber, que a parede também tinha o mesmo brilho que ela tinha visto antes naquele homem, com o mesmo movimento de vibração. Não demorou muito, a parede foi ficando transparente e aos poucos, desapareceu diante de seus olhos, se juntando ao brilho inexplicável que emanava de tudo que estava à sua frente. Naquele momento, através de tudo que racionalmente a gente chama de real, ela estava vendo o jardim de inverno que estava do outro lado da parede e mais adiante, aconteceu a mesma coisa com a outra parede que ficava no fundo do jardim interno do hotel e assim sucessivamente, rumo ao infinito. Beatriz ficou absolutamente atônita. Ela estava enxergando através de tudo que estava em sua frente e naquele momento, ela sentiu como se fosse parte de tudo aquilo. Era como se ela estivesse nadando num imenso oceano de luz e nunca sentiu seu corpo tão leve em sua vida. Naquele momento ele parecia não existir. Ela tinha consciência de sua existência, mas não conseguia determinar onde ela mesma começava fisicamente e onde as outras coisas e pessoas terminavam. Inexplicavelmente, para o que chamamos de racional, ela sentiu-se parte de toda aquela energia, daquela luz. Ela compreendeu que nós e tudo que esta à nossa volta, somos uma unidade, uma infinita massa de luz e energia, sem começo, e sem fim.
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Que nós todos, assim como tudo que conhecemos como sendo físico, como sendo real, não pode existir, sem a existência de tudo que nos rodeia, num âmbito universal. Não importa o quão diferentes, nós e todas as coisas possamos parecer aos olhos da razão, é assim que somos, uma unidade infinita e que nesta unidade, esta a resposta que humanidade procura a séculos sem encontrar. Nesta infinita força universal formada por tudo e por todos, esta a resposta para o mistério da criação. Passado algum tempo, ela foi aos poucos recuperando o sentido de matéria física e quando voltou a pensar normalmente, sentiu uma profunda paz, uma sensação de poder, de força, de fé e uma emoção imensa tomou conta de seu coração. Ela renasceu naqueles momentos de imersão nos mistérios da vida e isto trouxe de volta a Beatriz que quase havia morrido dentro dela. A experiência foi tão grande e sua conscientização espiritual foi tão intensa, que na véspera de sair do hotel, quando ela passeava pela manhã no jardim, ela se deteve em frente a uma roseira e misteriosamente, fixou seu olhar numa linda rosa vermelha. Ela ficou lá olhando a flor e nela, ela viu o mesmo brilho, o mesmo campo de energia que parecia vibrar e de repente, ela sentiu como se ela mesma estivesse sendo absorvida pela rosa, era como se as duas estivessem ocupando o mesmo lugar no tempo e no espaço. Ela sentiu dentro de si mesma, o perfume daquela flor. Foi mais um momento maravilhoso, de uma emoção indescritível com palavras e em meio a tudo isto, ela perguntou à rosa, qual era o propósito delas neste mundo e qual era o motivo de sua existência. A resposta veio de uma forma emocionante, como se estivesse vindo de dentro dela mesma, mas ela claramente sentiu que era a rosa respondendo, que elas existem neste mundo físico, para lembrar àqueles que se esqueceram, que nós humanos, somos seres maravilhosos, de uma beleza sem igual, tanto por dentro quanto por fora. Que não importam nossas aparências e que elas, estão aqui como instrumentos divinos, para nos lembrar desta beleza e que o perfume delas, de que tanto gostamos, que nos trás um sentimento profundo de paz, faz com que a mensagem delas possa ser ouvida e compreendida, por nosso eu interior.
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Os dias de descanso acabaram. Beatriz voltou para casa e sua vida nunca mais foi a mesma. Tudo mudou de uma forma, que contando ninguém acreditava. Seu relacionamento com seu marido, com seus filhos, com toda a sua família e seus parentes, tornou-se maravilhoso. Todos aqueles que a rodeavam passaram a receber através de seus abraços, seus beijos e palavras de carinho, amor, compreensão e principalmente de aceitação, os benefícios de sua conscientização de fazer parte de uma energia universal. Nas escolas, ela se tornou mais perceptiva, sabia como enxergar o verdadeiro brilho interior de cada aluno, sabia que uma vez que todos somos um só, não há diferenças, que somos todos iguais. Certa feita, ela que antes de sua viagem interior só dava broncas, respondia à altura aos desaforos e ofensas dos jovens, se deteve diante de uma situação difícil, com um de seus alunos. Ela havia dado como trabalho individual, a criação de um texto, que poderia ser sobre qualquer objeto que cada um deles escolhesse. Os alunos teriam uma semana para escrever no mínimo quatro folhas sobre o objeto escolhido. Três dias depois, um deles a encontrou no corredor e pediu para ser liberado de fazer seu trabalho. Beatriz que agora já conhecia muito mais sobre seus alunos, do que nunca conheceu em toda a sua carreira, sabia que Breno era um rapaz esforçado, pobre, mas de boa família e além do mais, nunca deixou de entregar um trabalho sequer. Ela achou aquilo muito estranho e com espírito iluminado, com muito tato, fez com que o rapaz lhe dissesse o motivo pelo qual ele não queria ser obrigado a fazer o trabalho. O jovem disse a ela que quando chegou em casa, comentou alegre com sua mãe sobre o texto que deveria criar e pediu ajuda, para que ela sugerisse um objeto para ser o tema de sua lição. Foi então que ela o levou até seu quarto e chegando lá, abriu uma gaveta e tirou do fundo dela uma caixa e dela, um relógio de bolso que havia sido de seu pai, dizendo que aquele seria o objeto ideal para lhe servir como inspiração e neste momento, ele não pôde compreender o porquê dela guardar um relógio que havia sido de seu pai, se já não mais viviam juntos ha tanto tempo.
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Ele disse com lágrimas nos olhos, que quando sua mãe colocou o relógio na palma de sua mão, ele não pensou duas vezes, atirou o relógio na parede do quarto, fazendo com o impacto, um buraco na pintura. Disse ainda que ele o havia jogando com tanta força e tão alto, que ele caiu atrás do imenso guarda roupas de sua mãe, mas ela nem sequer gritou com ele, nem ao menos ficou nervosa. Apenas o olhou do mesmo jeito de sempre, com carinho e com amor. Breno disse que saiu correndo do quarto, sem dizer mais nada. Bateu a porta atrás de si e foi chorar em seu quarto, com a porta trancada. Beatriz ouviu tudo o que o rapaz tinha a dizer, dando a ele toda a atenção que ele merecia, pois visivelmente ele estava passando por maus momentos no âmbito emocional. Quando ele acabou de falar, ela disse que ele não precisava escrever sobre aquele relógio se ele não quisesse, mas de qualquer forma, o liberou de sua obrigação. Quando ela chegou em casa, ligou para a mãe de Breno e contou a ela o que havia ocorrido e do outro lado da linha, chorando, a mãe do adolescente agradeceu por ela ter ligado contando tudo e que ela não sabia que seu filho guardava tanto rancor por ela ter se separado de seu marido. Disse ainda que iria conversar com Breno, com muito tato, de uma forma que ele não se sentisse sendo repreendido pelo que fez com o relógio, muito menos que aumentasse nele, o rancor pela separação de seus pais. Beatriz não disse, mas pensou consigo mesma que aquela era uma mãe sábia, pois este era o melhor caminho para se chegar à melhor solução. Na próxima aula, o rapaz entrou na classe de cabeça erguida, com um sorriso simples e sincero em seus lábios e disse a ela que estava meio cansado naquele dia, porque havia arrastado um móvel muito pesado em sua casa. Ela não precisou adivinhar o que aconteceu. Sorriu de volta e pediu para que todos se sentassem, a aula começou, e agora, suas aulas eram sempre calmas, todos lhe davam toda a atenção. Tudo que ela trazia para discutir com seus alunos, era como se fossem presentes dados por ela, não obrigações para serem cumpridas. Suas aulas eram produtivas, prazerosas, tanto para ela, quanto para os alunos. A aula terminou, todos entregaram suas lições de casa, ainda não era o dia da entrega do trabalho de composição do texto sobre o objeto escolhido por cada um, mas Breno aproximou-se da mesa de Beatriz, deu a ela uma folha de papel dobrada e pediu para que lesse depois, quando ele já tivesse ido embora.
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Ela sorriu para o rapaz, levantou-se de sua cadeira, passou a mão no cabelo do rapaz num gesto de carinho, ele sorriu, virou-se, caminhou confiante e se foi, sem olhar para trás. Ela não pôde esperar chegar em casa e curiosa para saber o que ele havia escrito, Beatriz desdobrou a folha e nela haviam umas poucas palavras, mas estas palavras, diziam tudo o que aconteceu depois da conversa que ele teve com sua mãe:
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Composição de texto
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Título: Objetos.
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Objetos são apenas objetos.
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Eles não tem o poder de machucar, ou curar a ninguém.
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Somente as pessoas podem fazer isto e todos nós, temos garantido o direito de escolher ser machucados, ou curados, por aqueles que nos amam de verdade.
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Aluno: Breno Teixeira
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Professora: Beatriz
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Breno esqueceu-se de colocar a classe, a série, mas não tinha importância. Ela estava feliz com o resultado positivo de tudo que aconteceu com o rapaz, porque ele, com sua sensibilidade e percepção aguçada do mundo e da vida, logo encontraria como ela encontrou, uma rosa, que iria dizer a ele, da mesma forma que ela ouviu daquela flor, qual é o propósito delas, e o porque de sua existência neste mundo.
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E assim, pensando no que aconteceu a ela ao fixar seus olhos naquele velho homem ha muito tempo atrás, Beatriz juntou todos os trabalhos, contemplou a classe vazia e do fundo de seu coração, ela desejou que as horas passassem depressa e que o amanhã logo chegasse, para mais uma vez, receber aquele “Oi professora!” de cada um de seus alunos, porque apesar dela ser a mestra deles na sala de aula, ela aprendia com eles a cada dia e se sentia parte de todos eles, parte de sua energia, de seu brilho, de sua luz, exatamente como Deus nos fez.
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Ela saiu da sala, seguiu pelo corredor até a sala dos professores e pelo caminho, encontrou muitos ex-alunos e no rosto de cada um deles, ela pode ver o futuro de nossa nação, o futuro deste mundo, da humanidade, no seu mais amplo sentido. Era como se emanasse de todos eles, aquele mesmo brilho que ela viu pela primeira vez envolvendo aquele velho sentado em sua frente no saguão daquele hotel, quando ela recebeu a maior e mais importante revelação, de toda a sua vida.
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Autor: José Araújo