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domingo, 25 de janeiro de 2009

AMOR, ESTRANHO AMOR...



Tarde de inverno em São Paulo. Estava muito frio naquele dia. Os termômetros digitais espalhados pela cidade e no alto do edifício do Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, mostravam naquele momento oito graus. 
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Giseli saiu do banco onde trabalhava e foi direto para a faculdade que ficava próxima da estação São Judas do metrô. Ela morava do outro lado da cidade, no bairro do Tatuapé. Quando terminavam as aulas, ela saia praticamente correndo para poder chegar logo em casa e poder descansar um pouco, pois pela manhã ela tinha que estar no trabalho às 9:00s. Desde que chegou à capital paulista vinda do Rio de Janeiro, ela só trabalhava e estudava, mal dava tempo para descansar. Em sua vida corrida, não havia espaço para cuidar de sua vida sentimental. O único tempo vago que ela tinha, era usado para ensaiar. Estudante de musica, algo que sempre a fascinou desde criança, ela tinha paixão pelo violino e seu sonho era poder um dia tocar numa orquestra no Teatro Municipal. Quando ela chegou em São Paulo, procurou imediatamente um pequeno apartamento próximo dos meios de transporte, para que não sofresse tanto com as mudanças na sua vida. Através de uma imobiliária indicada por um amigo, ela conseguiu alugar um que parecia ter sido feito para ela. Cada espaço tinha sido muito bem projetado e apesar de ser muito pequeno, era agradável e extremamente funcional. Na convenção do condomínio estava bem claro que após as 22hs era obrigatório o silêncio e para ela, uma estudante de música, aquele era o único e talvez, o maior inconveniente. Quando ela não tinha aulas, coisa rara, ela gostava de praticar tocando suas músicas e isto parecia incomodar profundamente o vizinho de baixo que vivia cutucando o teto com um cabo de vassoura para que ela parasse de tocar. Dentro de seus direitos como todo condômino, ela continuava até que o relógio apontasse para hora limite e ai então ela parava de tocar. Esta situação se repetia sempre que ela tocava seu instrumento e aquilo a deixava muito triste e incomodada, porque afinal, em seus pensamentos, uma pessoa que não gosta de boa música, não deve gostar de mais nada na vida. Ao contrário do vizinho de baixo, o de cima, ela nem ouvia.
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Ele quando não estava fora, estava fazendo seus trabalhos em seu computador. Parecia que a musica dela nem ao menos era ouvida por ele. Durante muito tempo eles não se viram, aliás, ela só teve oportunidade de vê-lo de relance na portaria do prédio, poucos dias depois que se mudou e dai em diante, nunca mais o viu. Foi uma coisa tão rápida, que ela nem mesmo teve a chance de ver o seu rosto porque ele estava de costas falando com o zelador. Giseli soube quem ele era através do porteiro quando foi pegar as correspondências no final da tarde. De certa forma, a ausência dele em seu apartamento a preocupava. Mesmo sem conhecê-lo, ela sentia como se algo nele lhe fosse muito familiar. Certa noite, um temporal imenso se formou nos céus da capital e trovões acompanhados de descargas elétricas assustavam os moradores da zona leste. Devia ser mais ou menos 8hs da noite quando o vizinho de cima mal entrou em casa e saiu novamente. Ele tinha que estar num compromisso que havia marcado com os amigos e saiu tão rápido para não se atrasar, que esqueceu seu computador ligado quando se foi. Os raios e trovões cada vez mais fortes, causavam falta de energia em muitos pontos da cidade. Os alagamentos como sempre, já tiravam a alegria dos paulistanos. Num determinado momento, um raio de proporções imensas caiu nas proximidades do edifício onde ela morava e a descarga elétrica atingiu todo o sistema elétrico do condomínio, causando um black-out total. Naquele dia ela estava em casa ensaiando e quando as luzes se apagaram ela ficou um pouco assustada, mais pelo barulho feito pelo raio do que propriamente pela escuridão em que se viu. Pacientemente ela aguardou que a situação se normalizasse por algum tempo, mas quando já eram praticamente 3 horas da manhã ela foi dormir. Os estragos haviam sido grandes e o conserto do sistema elétrico só seria possível no dia seguinte. Só pela manhã, com a energia restabelecida é que todos os moradores puderam ver exatamente quais as consequências daquela descarga elétrica tão violenta. Aparelhos de TV, DVD, som e eletrodomésticos haviam sido queimados, causando perda total. Alguns mais afortunados não tiveram todos os seus aparelhos eletrônicos destruídos, apenas alguns e entre eles estava o vizinho de cima. Quase tudo havia sido poupado. Menos o computador.
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Muito nervoso, ele começou a gritar em seu apartamento e Giseli ouvia tudo com clareza. As paredes eram como uma casca de ovo de tão finas e qualquer barulho que se fizesse em outro apartamento, os vizinhos ouviam. No dela como estavam todos desligados enquanto ela ensaiava tocando o violino, nada foi perdido e ela compreendeu bem a revolta do rapaz que precisava de seu PC para fazer seus trabalhos. Dizendo palavrões até para a sua própria sombra, ele saiu batendo a porta atrás dele violentamente. Naquele dia ela estava de folga e não foi trabalhar. Uma folga no meio da semana para ela era perfeito. Durante o dia ela podia tocar seu instrumento tranquila porque o vizinho de baixo não estaria em casa e não atrapalharia sua concentração. Em determinado instante, ela começou a tocar A Primavera de Vivaldi e ela tocava com tanto sentimento, que se desligou totalmente do mundo do lado de fora. Ela se entregou a tocar aquela musica com os acordes que saiam de sua própria alma. A musica linda e envolvente parecia que tomava conta do ambiente e se espalhava para além das paredes de seu apartamento. Um silêncio profundo, se fazia presente servindo de fundo para suas notas musicais. Não se ouvia o barulho dos carros lá fora. Nem o som das crianças brincando no Play Ground do edifício. Ela sentia literalmente estar flutuando. Carregada pela melodia que sempre lhe acompanhou desde pequena. Gisele conhecia a partitura daquela obra de trás para frente. A Primavera de Vivaldi estava agora em todo o seu ser. De repente ela ouviu um acorde de um instrumento que não era o dela e ele começou a tocar a mesma musica, em perfeita sintonia com ela. Parecia que o musico que a estava tocando, estava no apartamento de cima. Como seria isto possível? Ela pensou. Não há ninguém lá neste momento e segundo o que porteiro disse, o rapaz estuda arquitetura. Quem poderia estar tocando violino? De qualquer maneira, ela continuou a tocar e aos poucos a sincronia que se seguiu entre ela e o músico desconhecido, tocou fundo o seu coração.
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Horas depois ela parou de tocar e o desconhecido também. No final da tarde, antes de sair para a faculdade, ela pegou seu instrumento e olhando para ele com o mesmo amor de sempre, o colocou no ombro e começou a tocar Canção para Ana. No mesmo instante, no apartamento de cima, alguém começou a tocar a mesma musica. Ela estremeceu. Ele tocava com tamanha perfeição que as lágrimas vieram aos olhos de Gisele de tanta emoção. Ele tinha um estilo diferente. Os acordes que ele conseguia em seu instrumento eram de alguma forma algo muito especial. Era uma coisa que ela não sabia explicar, mas tocava o fundo de sua alma. Quando ela parou de tocar, desta vez ele continuou. Foi a mais bela apresentação de Canção para Ana tocada por um violinista que ela já tinha ouvido na vida. De alguma forma ela se sentiu atraída pelo artista. Ele devia ser um homem muito especial. Um daqueles seres que tem sentimentos e que sabia como demonstra-lo através de sua arte, de uma maneira tão maravilhosa que encheu o coração dela de alegria. Apaixonada pela musica e pelo artista que a estava tocando, ela se deixou levar pelas asas da imaginação. Gisele se viu tocando ao lado de um violinista que não tinha rosto. Ao lado dela, na penumbra do palco onde eles apresentavam juntos, ela não conseguia enxergar seu rosto, mas olhava para ele com verdadeira adoração. De repente a musica parou. Ela voltou à realidade. Olhou para o relógio na parede e teve que sair correndo para não chegar atrasada na faculdade. No caminho, ela pensava naquele musico maravilhoso que estava tocando no apartamento de cima e uma vontade imensa de conhecê-lo pareceu enraizar-se em seu coração. Naquela semana ela não teve mais tempo de ensaiar. Saia cedo e chegava tarde e não poderia fazer barulho após o horário estipulado pela convenção. O final de semana chegou. Ao passar pela portaria na sexta feira, ela ouviu o porteiro dizer ao seu colega de trabalho, que o rapaz que morava acima do apartamento dela, tinha estado fora desde o dia seguinte em que o raio caiu por causa do seu PC que havia sido queimado. Que sem tempo para leva-lo ao conserto, ele precisou ficar na casa de amigos, para poder fazer seus trabalhos da faculdade.
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Ela balançou a cabeça negativamente, mas não disse nada a ninguém. Ela pensava consigo mesma em como aquilo era possível. Havia alguém naquele apartamento e quem esteve lá era um musico que tinha um talento que ela nunca tinha ouvido em sua vida. Já dentro do elevador, algo fez com que ela apertasse a tecla do 5º andar. Gisele morava no 4º, mas seus dedos não obedeceram à sua mente e apertaram a tecla do andar de cima. Quando a porta se abriu, ela ficou parada dentro do elevador. Ela não tinha a menor ideia do porque ela tinha feito aquilo. Sem movimentação a porta ia se fechar. Alguém havia chamado o elevador no andar térreo. Ela segurou a porta. Como se fosse guiada por uma força maior, ela saiu dele e se dirigiu para a porta do apartamento de seu vizinho. Ao chegar em frente, como se tivesse a intenção de abrir a porta ela segurou na maçaneta. A porta se abriu lentamente. Atônita com os acontecimentos, ela entrou devagarzinho. A curiosidade em descobrir quem esteve lá, tocando aquela linda canção ao violino foi mais forte do que ela. O ambiente estava escuro. As janelas estavam fechadas e na pequena sala havia uma janela maior, onde uma cortina fechada dava ao ambiente, a meia luz. Ela se lembrou do que ouviu o dono do apartamento gritar quando saiu. Instintivamente ela olhou para o computador colocado em cima de uma escrivaninha, e se aproximou. O monitor de 20 polegadas estava totalmente apagado. Ela pode ver que o cabo de força que alimentava a CPU através de um estabilizador estava fora da tomada. Que bobagem. Ela pensou. Depois do que aconteceu ao equipamento não havia mais necessidade disto. Aquele apartamento vazio e naquela penumbra, lhe pareceu tão solitário. Ela se lembrou da musica que ela tocou com o violinista desconhecido. Como seria bom se ele estivesse aqui neste momento. Foi o que passou por sua mente.
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De costas para o monitor ela não viu, mas um pequeno ponto de luz piscou no centro de sua tela. Ela estava absorta em seus pensamentos e observando com interesse algumas fotos e quadros pendurados na parede. De repente ela ouviu uma nota musical. Ela deu um pulo assustada e olhou para trás. Naquele exato momento ela viu que um pequeno ponto de luz estava desaparecendo na tela do computador. Arrepiada, ela automaticamente pensou que aquilo era impossível de estar acontecendo. Não havia energia. O cabo de força não estava plugado na tomada, e além do mais, o aparelho tinha sido queimado naquele dia em que o raio caiu nas proximidades. Estou vendo coisas. Ela imaginou. De certa forma amedrontada, ela resolveu sair e ir para o seu apartamento. Quando ela estava se dirigindo para a porta de saída, mais uma vez ela ouviu a mesma nota musical. Como música ela conhecia muito bem aquela nota. Era a mesma com que começava A Primavera de Vivaldi. Seu coração disparou. Na tela do computador um ponto de luz havia surgido e estava um pouco maior do que aquele que ela tinha pensado ter visto antes. Outra nota se fez ouvir. Gisele paralisada, agora estava em pé em frente ao PC. Outra nota seguida de outra e mais outra iniciaram ao som de um violino a execução daquela musica que sempre a fascinou. No centro do monitor surgiu o desenho de um coração que pulsava em ritmo compassado com a musica. Sem saber o que pensar, nem como agir, ela ficou parada onde estava e passou a ouvir a canção. Então foi ele! Ela pensou. Quem tocou comigo a Canção para Ana foi o computador! Devo estar ficando louca! Só pode ser isto! Meu Deus! Que devo fazer? Enquanto ela pensava, bem no meio do coração que batia ao compasso da canção, uma frase foi surgindo e nela Gisele pode ler... EU TE AMO!
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Ela quase desmaiou. Aquela máquina, um equipamento eletrônico estava dizendo que a amava! Isto é loucura! Ela gritou. Falando alto como se alguém a estivesse ouvindo, ela disse que iria embora. Que precisava tomar um banho para se acalmar porque com certeza, ela estava tendo alucinações. Na tela então surgiu um rosto. Nele não havia expressões definidas. Parecia mais um daqueles seres virtuais que se vê em filmes de ficção, mas claramente ela pode ver uma lágrima saindo de seus olhos e que escorria lentamente. Um sentimento de angustia tomou conta de seu coração. Aquela máquina estava demonstrando sentimentos. Ela sofria porque ela iria embora e estava chorando! Gisele fechou os olhos, balançou a cabeça e virou-se em direção à porta e sem olhar para trás, decidida ela caminhou até lá. Abriu a porta e saiu. Naquele mesmo instante, o monitor se apagou. Já em seu quarto, após uma ducha longa e relaxante, Giseli estava deitada em sua cama, mas não conseguia dormir. A imagem daquele rosto virtual chorando não saia de seus pensamentos. Angustiada por não encontrar uma resposta plausível para tudo o que aconteceu e muito cansada pelo dia exaustivo, seguido daquelas fortes emoções, finalmente, horas mais tarde, ela adormeceu. Na manhã do dia seguinte, um domingo ensolarado como não se via ha dias, ela acordou um pouco mais tarde e a primeira coisa que lhe veio à mente foi aquele computador. Com a mente mais leve e com mais capacidade de raciocinar depois do sono revigorante, ela imaginava o que teria feito com que aquela máquina mostrasse sinais de vida, de sentimentos e o mais incrível e inexplicável, ela mostrava sinais de estar funcionando sem energia elétrica. Alimentada por uma estranha energia e sem que ao menos o cabo de força estivesse ligado à tomada da parede. Depois de tomar seu café da manhã, ainda pensando no assunto, com sua mente esclarecida e inteligente, ela finalmente chegou à conclusão de que alguma coisa que está entre o céu e a terra havia feito aquela proeza incrível. Que de algum jeito, quando houve aquela descarga elétrica, aquela máquina ganhou uma força inexplicável e seu potente processador passou a executar funções e tarefas para as quais ele não havia sido criado.
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Lembrando-se da lagrima que caiu daqueles olhos virtuais, seu coração se apertou. Fosse o que fosse, ele demonstrou por ela um amor profundo, coisa que muitos humanos não são capazes de fazer. No fundo de seu coração, ela sentia um carinho enorme por aquela máquina e não queria vê-la sofrer. Ela tentou varias vezes durante o dia não pensar mais no assunto. Em esquecer aquilo de uma vez por todas, mas algo parecia que tinha necessidade de lembrá-la da existência daquele amor. Quando chegou o final da tarde, sabendo que o rapaz ainda não tinha voltado para casa, Gisele pegou seu violino e foi para o apartamento dele. A porta ainda estava destrancada e ela nem precisou girar a maçaneta porque ela se abriu sem que ela ao menos tocasse nela. Ao entrar, a penumbra ainda predominava no ambiente e ela imediatamente olhou para o computador. O monitor estava totalmente apagado. Não havia o menor sinal de vida naquela tela. Um sentimento estranho de decepção se apossou de seu peito. Do fundo de seu coração, ela esperava ver e poder falar com o que quer fosse que estivesse lá. Tomada por uma tristeza profunda, ela se preparou para sair, mas antes, sentiu uma vontade imensa de tocar seu violino naquele lugar. Giseli o posicionou no ombro e começou a tocar. Sem saber exatamente porque, a musica que ela tocou foi Canção para Ana. Aos primeiros acordes do violino, a tela do monitor se acendeu. Aquele rosto virtual do qual ela não podia esquecer, apareceu de novo na tela do computador. Desta vez, a expressão daquele rosto virtual era de alguém que estava feliz. Havia em seus lábios um sorriso de felicidade e em seu olhar, um imenso amor. Com o coração acelerado, ela não parou de tocar. Logo após, no lugar do rosto as imagens que se via eram de notas musicais. Em meio a elas, centenas de pequenos corações flutuavam na tela, movimentando-se de acordo com o ritmo da musica. Foi uma emoção incrível. Ao mesmo tempo em que os coraçõezinhos e as notas musicais dançavam na tela, o PC começou a tocar a mesma canção junto com ela. Dentro de poucos minutos, o ambiente estava totalmente envolvido pela energia do amor.
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A musica os havia unido de uma forma muito especial. Tocando o instrumento que ela realmente gostava de tocar, ouvindo aquele músico tão especial tocando em uníssono com ela aquela canção, Giseli sentiu que o estava amando também. Desta vez ela não procurava mais por respostas. Apenas aceitava as coisas como elas surgiram. Durante o período em que tocaram juntos naquela tarde, foi como se tivessem feito amor. Uma sensação plena de satisfação e realização, a fez sentir-se amada como nunca o foi. Já era noite quando ela resolveu ir embora. Na tela estavam os coraçõezinhos e as notas musicais ainda em movimento e ela agora, já falava com o PC como se fosse uma pessoa e disse a ele que precisava ir. Mas assim que pudesse, ela voltaria para tocarem juntos outra vez. Foi neste momento que o rosto virtual apareceu na tela novamente, mas sua expressão era de tristeza. Uma tristeza tão tocante que provocou um arrepio em Giseli. Através de caracteres que surgiram um a um na tela, ele disse a ela que agora era ele quem tinha que partir. Disse que sua passagem pela vida dela já estava chegando ao fim. Que desde o momento em que ele ganhou vida após aquela descarga elétrica, ela sabia que logo teria que partir. Como um computador multimídia de ultima geração, capaz de processar com rapidez e eficiência as informações externas que recebia, ao ouvi-la tocar com tamanho sentimento, ele não conseguiu deixar de se apaixonar por ela. Contudo apesar do amor que ele sentia por ela ter tomado conta de todas as suas placas, circuitos e outros componentes, ele tinha que partir. Ela caiu em prantos. Depois de ter aceitado a existência dele e daquele amor como uma realidade, ele estava lhe dizendo que iria embora. Que nunca mais ela iria vê-lo! O coração dela se partiu. Aquele ser de uma capacidade sentimental imensa, com um talento para a musica que poucos têm na vida, ia desaparecer de sua vida. Entre lágrimas ela o pediu a ele que não se fosse. O rosto virtual, com os olhos cheios de lágrimas disse a ela que não poderia. Que a estranha força que lhe concedeu a vida estava se esgotando. Seu fim estava próximo. Era questão de poucas horas para ele partir. Foram momentos de muita tristeza que ela nunca mais esqueceu. Depois de algum tempo de silêncio, ele escreveu em sua tela que antes de partir, iria deixar algo para ela, que faria com que ele estivesse sempre presente em sua vida. Mas surpresa. Ela teria que esperar até a manhã do dia seguinte. Abatida e decepcionada com a dura realidade, ela se aproximou da tela e beijou suavemente a figura daquele rosto virtual.
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Naquele instante ele sorriu e escreveu na tela, as ultimas palavras que ele iria dirigir a ela. Ele escreveu em letras enormes, que o amor que ele sentia por ela e por sua música seria imortal. Agradeceu pelo beijo, deu um sorriso e escreveu em letras maiores ainda, tendo como plano de fundo um lindo coração vermelho e pulsante, a frase EU TE AMO. Aquela imagem ficou estática na tela por algum tempo e de repente, ela se apagou. Quando ela saiu do apartamento já era noite. Tudo estava escuro e mal dava para ver onde pisava. Ao fechar a porta atrás dela mesma, uma sensação de perda insuportável invadiu seu coração. Chegando em casa ela nem quis jantar. Tomou um banho e foi deitar-se na esperança de pegar no sono e esquecer os últimos acontecimentos de sua vida. Eram 6:30s da manhã quando ela acordou. Como sempre fazia todos os dias, enquanto se preparava para sair para o trabalho ela ligava a TV para ouvir as primeiras noticias e o computador para ler os seus e-mails. Ao ligar a TV ela não pode crer no que seus olhos estavam vendo. Uma reportagem mostrava um concerto no Teatro Municipal de São Paulo e a orquestra estava tocando A Primavera de Vivaldi. No palco, ao fundo de um cenário romântico e primaveril, que dava um clima especial à musica tocada pela orquestra, havia um enorme coração vermelho e escrito bem no meio dele, estava a frase EU TE AMO. Seu coração quase parou. Suas pernas bambearam e ela quase desmaiou. Ouvindo aquela musica que era tudo para ela, vendo o coração com aquela frase escrita nele, mais do que nunca, ela acreditou numa velha e antiga frase, que descreve muito bem a complexidade da vida. Uma frase tão real, tão incrivelmente perfeita, mas que poucas pessoas levam a sério o seu conteúdo, e que diz:
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"Existem mais coisas entre o céu e a Terra, do que possa imaginar a nossa vã filosofia."
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Naquele dia ela foi trabalhar feliz. Giseli carregava no peito um amor muito especial. Um amor por alguém que ela nunca pensou poder existir, mas que por causa de alguma força muito superior surgiu em sua vida e de quem ela jamais iria se esquecer, pelo resto de seus dias. No final do expediente como sempre ela saiu correndo direto para a faculdade. Ao chegar lá ela recebeu de uma amiga um bilhete que havia sido deixado por um rapaz pouco antes dela chegar. Curiosa ela abriu e descobriu que quem o havia mandado era seu vizinho do apartamento de cima. Ele lhe pedia desculpas pela falta de educação de não ter se apresentado desde que ela se mudou e a convidava para um jantar em seu apartamento. Confusa com a surpresa e curiosa para saber o que havia sido feito do computador, ela aceitou. No dia marcado ela se arrumou o melhor que pode e pontualmente apertou a campainha do apartamento dele. Ao abrir a porta, ela pode ver finalmente seu rosto que ainda não tinha visto. Os dois ficaram mudos no mesmo instante. Nenhum deles esperava o que eles viram. O que se seguiu depois, foram beijos e abraços saudosos que nenhum deles esperava que pudessem acontecer. O rapaz era seu ex-namorado que havia ido estudar no exterior há anos atrás. Um amor que não havia morrido no coração de nenhum dos dois, mas por coisas que só o destino pode explicar, eles acabaram perdendo o contato e nunca mais se viram. Num clima de amor e reencontro eles conversaram muito naquela noite. Fizeram amor como nunca tinham feito antes em suas vidas, e pela manhã, deitados na cama lado a lado, ele lhe disse que quando chegou em casa no dia em que voltou trazendo um novo computador, ele soube através de um e-mail enviado por um desconhecido que a sua vizinha do apartamento de baixo era estudante de música e isto aguçou sua curiosidade. Ele se recordou dos momentos felizes que viveram juntos no passado, mas não tinha esperanças de reencontrar o seu grande amor. Sem saber exatamente o motivo, ele resolveu convida-la para jantar e quebrar o gelo.
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Giseli olhou bem dentro de seus olhos e sorriu. Naquele instante, ouvindo aquela narrativa de como ele resolveu convida-la para jantar, ela se lembrou de um alguém muito especial. Ele disse também, que quando estava jogando o velho computador no lixo, percebeu que a tela do monitor estava marcada com algo parecido com um coração, e no meio dele, estava escrita a frase EU TE AMO em letras garrafais. Giseli não pode deixar de se emocionar. Seu amor há muito não visto estava finalmente ali, ao seu lado. Ele estava deitado de costas ao lado dela na cama olhando para o teto sorrindo e pensativo. Ela virou-se e se colocou por cima dele e o beijou com muito amor. Ela nunca contou a ele tudo que aconteceu entre ela e aquele computador, mas sabia que o reencontro dos dois não tinha sido por acaso. Que a felicidade em que ela estava finalmente vivendo com seu grande amor, tinha sido sem dúvida nenhuma, mais uma obra de seu outro amor. Um estranho amor. Um amor diferente, mas muito real. Que foi capaz de abrir mão de seus próprios sentimentos em prol da felicidade dela com outra pessoa e deu um jeito de que ela e seu antigo namorado se reencontrassem de novo. Ele se foi, mas deixou marcas profundas no coração e na vida dela.
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Para Giseli, inexplicavelmente, como é característico do amor, ele foi e sempre será para ela, até o fim de seus dias, um amor, estranho amor, que aconteceu em sua vida de uma forma misteriosa, quase milagrosa e do qual ela jamais iria se esquecer.
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Misteriosamente, no final daquela tarde, em todos os cantos da cidade, onde quer que houvesse um monitor de vídeo, por apenas alguns instantes, havia um coração vermelho e pulsante sendo mostrado em sua tela e no meio dele, estava escrita a frase EU TE AMO em letras maiúsculas. A mesma frase que Giseli leu na tela daquele computador, na primeira e na ultima vez em que ela o viu. A cidade inteira parou por alguns poucos minutos para admirar aquele símbolo do amor. Os namorados de alguma forma não viam a hora de se encontrar. Os casais em seus lares se abraçaram como há muito não faziam. O clima de amor tomou conta da cidade de pedra naquela noite. No dia seguinte as pessoas não eram as mesmas. Elas passaram a se comportar de maneira diferente. Elas sentiam e demonstravam seus sentimentos sem medo nem vergonha. Elas se abraçavam na rua como nunca o fizeram. A amizade voltou a ser como antes. Os amigos eram verdadeiramente amigos e não se importavam com a condição social das pessoas. Quando gostavam de alguém era por seu eu interno e não por seu exterior. As crianças e os jovens adolescentes pareciam estar mais felizes. Os professores os tratavam de maneira diferente porque recebiam deles toda a atenção e respeito que mereciam. Os mestres agora tinham voltado a ter seus alunos como filhos, como uma extensão de suas famílias. Não encaravam seu trabalho exaustivo como uma obrigação para ganhar dinheiro. O amor que sentiam pelo ensino, que há muito tempo eles não podiam demonstrar, por causa da violência nas escolas, agora fluía livre de seus corações. Nas faculdades, os cursos que há muito tempo não tinham procura voltaram a lotar. A mídia durante dias divulgou o estranho acontecimento e as investigações para se descobrir quem teria feito aquilo, pareciam não levar a lugar algum.
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As pessoas passaram a revisar seus comportamentos para consigo mesmas e para com o próximo e de uma forma antes nunca vista. Acordaram para a realidade de que no âmbito profissional, não se pode ser feliz fazendo aquilo que não se gosta. Só pelo fato de ser uma profissão rentável. Passaram a ter consciência de que quando chegassem ao fim de sua jornada, após anos de trabalho duro e exaustivo naquilo com o qual nunca se identificaram, em nenhum momento de suas vidas, seu final seria muito triste. Tinham pleno conhecimento de que a frustração por não ter sido o que realmente desejavam na vida, seria seu pior castigo na velhice. Tudo mudou com a força do amor a partir daquele dia.
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Contudo, se as pessoas soubessem do que realmente havia acontecido entre Giseli e aquele computador, diriam em sua grande maioria, em sua vã filosofia, que achavam que aquilo tudo era loucura, alucinação.
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Somente alguns poucos, no mínimo poderiam dizer que aquele havia sido realmente um amor, mas sem duvida nenhuma, um amor, estranho amor...
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Autor: José Araújo















11 comentários:

Massahiro disse...

Eu estou sendo o primeiro a comentar agora! weeeeeee ^^
Acabi deler os dois últimos contos, só agora conseguir lê-los.
O primeiro "Promessa Cumprida" gostei muito, principalmente porque me lembrou um pouco uma história de um casal conhecido que sacrificou tudo pela filha que estava com uma doença rara.
O segundo achei muito inteiressante. O fato de mostrar que não existem coincidencias da vida e que o amor pode vir de lugares inesperados e das formas mais curiosas, porém não são por essas coisas que o amor deixa de ter a sua beleza.
Keep Writing o/

Unknown disse...

Incrível esse seu texto, que imaginação e capacidade de nos prender nessa leitura vc tem. Lindo e emocionante, uma estória de amor como poucas. Você pega a nossa vida atual, afazeres e a eterna falta de tempo e embala com a doçura de um conto de fadas, um Romeu e Julieta virtual, sem perder o encanto e a pureza. Existe explicação para o amor em suas variadas formas e demonstrações? Eu creio que não e vc também. Final magnifico, surpreendente, inesperado, estou deslumbrada com o que li.
Ando um pouco afastada por razões que vc conhece, e nesse periodo vc cresceu ainda mais como escritor.
Parabéns querido, escrevi tanto mas não consegui palavras para expressar o que realmente estou sentindo.
Beijos querido, beijos.

mdb disse...

Giseli era uma moça comum que trabalhava em um banco e após o trabalho, ela freqüentava uma faculdade.
A vida dela era uma correria não tinha tempo nem para o amor, aliás, quando tinha um tempo extra de dia ou antes de 22 horas, ela se dedicava a música que era seu sonho, um dia tocar violino em uma orquestra no Teatro Municipal.
Tinha um vizinho no andar de baixo, que era só ela começar a ensaiar que ele cutucava o teto com cabo de vassoura. Mas ela respeitava rigorosamente as normas do condomínio e continuava a tocar. Enquanto o vizinho de cima, intertido em seu computador parecia nem ouvi-la.
Certo dia, em um domingo armou um temporal daqueles.
Com fortes descargas elétricas de dar medo. E deu ima
Bem perto do prédio que deu um blak aut, que durou até o dia seguinte, com enormes prejuízos, principalmente para o vizinho de cima que teve que sair antes da chuva, para um compromisso e acabou deixando seu Pc ligado.
Quando chegou e viu o estrago o homem ficou irado e palavrões eram ditos que todos escutavam. Com isso teve
Que ir para casa de amigos para concluir o trabalho que estava fazendo, batendo a porta com tanta força, que dava para notar o estado que ele estava.
Giseli pegou seu violino e começou a tocar sua música preferida Primavera de Vivaldi e tocava com tanto sentimento que parecia que estava em outro mundo e de repente começa aouvir a mesma música no mesmo compasso que ela e vinha do andar de cima. Na portaria falaram que ele tinha ido para casa de amigos e como foi se está lá tocando pensou. Quando parava de tocar ele também parava. Com isso ficou curiosa. Quando chegou
Em casa naquele dia, ainda estava no elevador alguma coisa fez que apertasse o botão do andar de cima e foi.
Quando pegou na maçaneta a porta abriu sozinha, meio assustada entrou e não tinha ninguém. Deu uma olhada e ia saindo quando ouviu uma nota da música e voltou e viu o computador funcionando sem estar plugado na tomada e começou a tocar mais notas e aí apareceu um homem, ela
achou que estava tendo alucinação e foi embora mas antes apareceu um coração e dentro estava escrito Eu TE AMO.
Ela ficou ainda mais aíi apareceu um rosto de um homem, mas não dava para ver nitidamente e rolou uma lágrima. Ela foi embora e deitou mas custou a pegar no sono. No outro dia levantou cedo para o trabalho e ligou a TV para ver notícias e apareceu no teatro Municipal uma orquestra tocando e apareceu no placo o tal coração como o do computador, ela ficou assustada mas foi trabalhar. Quando voltou já foi direto ao apartamento e logo o computador ligou e ele apareceu feliz, pois ela estava ali e conversaram e ele disse que o tempo era curto para ele, pois restava poucas horas de vida e ela começou a chorar, que ele não poderia ir, mas ele disse que aquela descarga elétrica foi tão forte que alimentou umas placas no Pc que deu vida para ele e. Ele ia embora mas deixaria uma lembrança que ela jamais o esqueceria.. Mais uma lágrima rolou e apagou de vez o PC. No outro dia quando saía do serviço via em todas as lojas de Tv aquele coração com os mesmo dizeres e notou as pessoas mais felizes e mais amigas uma das outras. ser apareceu para unir as pessoas em todos os sentidos. Foi para a faculdade, assim que entrou recebeu um bilhete do rapaz do quinto andar convidando-a para jantar pedindo desculpas pela grosseria daquela noite. Ela aceitou o convite e mo outro dia, à noite estava na porta do apartamento dele apertando a campainha Quando ele abriu a porta, um fitava o outro e de repente se abraçaram e começaram a se beijar. Ele era o amor da vida dela e se perderam, pois partiram um para cada lado e nunca mas tiveram notícias um do outro.
Foi uma noite maravilhosa de amor, mas no seu silêncio ela lembrava do homem do computador que jamais esqueceu e que não achou explicação para aquele amor em silêncio.
Jose adorei e sempre o amor esá em evidência na vida do seu humano e muitos não querem enxergar.Parabéns meu amigo amdo muito lindo o texto.
Beijos da amiga para sempre Marilene

Anônimo disse...

Impossivel não amar você cara!
Que historia você criuou!
Mais uma vez você conseguiu me prender ao texto desde a primeira linha e a virada no final foi fantástica!
Como sempre eu praticamente vi os cenários e personagens de seu conto e te digo de coração que adorei!
Suave, romantico, misterioso, envolvente, nem sei mais o que dizer deste conto que no minimo é espetacular!
Amo você cara e você sabe disto!
Beijão querido!

Anônimo disse...

De uma suavidade e mistério totalmente fora do comum, seu texto associa o romance com a ficção e por fim nos leva mais uma vez a uma profunda reflexão!
Você é um escritor impar José!
Que o criador o mantenha sempre assim, pois é sua pureza de alma que me cativou desde o inicio!
Obrigado por fazer parte de minha vida mesmo que seja apenas através de contatos vituais!
Espero um dia poder receber um autógrafo seu e com uma dedicatória muito especial!
Seu leitor, amigo e fã de todo coração,

Anônimo disse...

Nossa meu querido! Neste conto voce foi mais longe do que eu esperava!
Que coisa mais linda José!
Com a crise de falta de sentimentos e demonstrações de afeto pela qual passamos neste mundo, eu não me importaria se meu computador se apaixonasse por mim! rs

Amei!

Só você mesmo com esta mente brilhante para criar algo assim!

Adoro voce meu amigo querido!

Anônimo disse...

Parabéns meu amigão José, esse conto "AMOR, ESTRANHO AMOR..." prendeu minha atenção do inicio ao fim!!!
A gente imagina as cenas do ocorrido com Gisele e o Pc, uma emoção tomou conta de meu ser, perfeito...
Parabéns,parabéns,parabéns...

Marciel Szerwinsk.

Anônimo disse...

Que viagem fantástica ao mundo da ficção, da imaginação e da realidade vivida em nossos dias!

Parabens pelo talento tão criativo!

Desde o inicio até o fim não consegui parar de ler!

Sucesso sempre!

Anônimo disse...

Caro José, a cada conto publicado uma nova emoção!
É impressionante como voce num único texto juntar tantas reflexões!
Este dom que você tem não foi dado a muitos neste mundo, então nunca deixe de escrever meu amigo!
Você nasceu para isto!

Parabéns por mais esta publicação e não se esqueça de que não só eu mas muitos outros leitores seus, estamos esperando um livro com seuss melhores contos!

Abração com a minha admiração de sempre!

Anônimo disse...

Sua capacidade de criação parace não ter fim!
Adoro a maneira como você constroi seus textos sempre utilizando situações corriqueiras nas vidas de todas as pessoas, utilizando-as para nos passar reflexoes maravilhosas!
Amor,estanho amor é uma das coisas mais lindas que já li e posso afirmar que nunca vou esquecer!
O detalhe do aparecimentodo coração com aquela frase em todos os monitores de vídeo da cidade foi simplesmente demais!

Beijos!

Anônimo disse...

Ai, José, estou aqui embasbacada com essa história inebriante que só poderia ter saído de uma mente brilhante como a sua! Nada mais me surpreende em seus escritos. Você é demais!
Vc consegue prender a atenção do leitor do começo ao fim, com o coração aos pulos de tanta emoção.
Adorei o final inesperado! Vivi essa história do começo ao fim, como se eu fosse a própria Giseli.
Quanto amor, quanta emoção!
Parabéns, amigo querido, mais uma vez!
Beijos.
Nara.